Prostitutas fazem curso de inglês de olho na Copa do Mundo 2014
Profissionais do sexo aprendem nova língua para recepcionar
estrangeiros. Além de inglês, professores também ensinam espanhol, francês e
italiano
Professor Elmo Lincoln dá aula de inglês e reclama da ausência de
algumas alunasFoto: Sara Antunes/G1
Laura Maria do Espírito Santo, de 54 anos, é
prostituta em Belo Horizonte (MG) e uma das alunas do curso de inglês
para profissionais do sexo, iniciado em 11 de março na capital, com
objetivo de educar os profissionais do sexo para recepcionar os turistas estrangeiros
na Copa das Confederações de 2013 e na Copa do Mundo de 2014.
Ela trabalha "há bastante tempo", como
prefere dizer, e lembra com saudade de quando teve um cliente canadense, que
mandava cartas e que por cinco anos visitou o Brasil para tentar convencê-la a
deixar o país com ele. Ela ri ao falar dos presentes recebidos do amante e de
como ele costumava falar em inglês e em francês ao seu ouvido; nada que pudesse
entender à época. A relação durou certo tempo, mesmo com a dificuldade dos
idiomas diferentes.
As prostitutas e travestis de Belo Horizonte também
podem fazer gratuitamente aulas de espanhol, francês e italiano, ministradas
por professores voluntários.
A reportagem acompanhou uma aula de inglês da turma
de Laura. Das 15 alunas inscritas, só sete compareceram. Muitas têm receio de
ir ao curso, em um shopping popular da cidade, enquanto outras trabalham em
horários diversificados, segundo explicou Cida Vieira, presidente da Associação
das Prostitutas de Minas Gerais (Aprosmig) – da qual Laura é vice-presidente.
É o caso de Agatha (nome fictício), de 25 anos. A
jovem frequenta as aulas desde o início, mas falta quando congestionamento não
deixa que ela chegue a tempo. Nascida em Piracicaba (SP), a estudante tem na
pronúncia sua principal dificuldade. Durante a aula, o professor Igor Fusch
comentou sobre a insistência dela em colocar o dáblio "antes de
tudo".
O método do professor é a repetição. Fusch, de 53
anos, morou por quase 20 anos na Austrália e retornou ao Brasil há quatro.
"Agora que está no começo, eu quero enfatizar os greetings, que é o
conhecer a pessoa", disse sobre um dos tópicos da aula. Para ele, um
desafio é se acostumar ao modo norte-americano e inglês de iniciar uma
conversa, pois tendem a manter certa formalidade.
A cada encontro, o professor ensina frases novas, e
as estudantes devem repeti-las. Em seguida, elas devem direcionar a questão a
Fusch, que responde para ensinar como se fala. Logo, elas também precisam
responder às perguntas. Os erros resultam em inúmeras risadas. Muitas meninas
são do interior e tem no sotaque uma grande dificuldade.
Outro problema é que muitas alunas não têm
escolaridade completa. Por isso, algumas lições precisam ser repetidas,
respeitando o tempo de aprendizado de cada uma das mulheres. "Sempre
faltam umas duas ou três. Então, quando elas vêm eu repito, aí as outras
guardam", disse o professor.
Elmo Lincoln, professor de inglês há cinco anos,
tem um método diferente de ensino. Ele prepara lições para entregar aos alunos
e explica como usar os verbos e formar frases no idioma. Lincoln também se
queixa da ausência de alguns alunos. Na aula desta terça-feira (16), apenas
três participaram.
Mas se comparecem às aulas, a vontade de aprender
impressiona. Para as prostitutas, as short answers (respostas curtas, em
português) ensinadas por Fusch não são suficientes. Quando o professor
questiona se as mães delas vivem em Belo Horizonte, o 'Yes, she does' e 'No,
she doesn’t ' é pouco. As alunas que perderam as mães, por exemplo, querem
saber como se fala ‘céu’ em inglês ou como mencionar São Pedro no idioma.
Outras começam a falar da cidade de origem das famílias.
Uma simples pergunta pode desencadear a revelação
de histórias pessoais, como quantos filhos elas têm, as músicas e comidas
favoritas, e a hora na qual costumam acordar. O professor ressalta que as
profissionais do sexo precisam aprender detalhes relacionados ao trabalho para
entreter os clientes e prevenir qualquer mal-estar. Outro conhecimento
importante é quanto aos preços dos programas.
Agatha espera ganhar mais com a chegada dos
estrangeiros. Ela afirma amar os cursos de inglês e espanhol. Mas nega aprender
os idiomas apenas para agradar os frequentadores da Rua Guaicurus – ponto onde
está a maioria dos hotéis nos quais os serviços ocorrem – e sim para ter mais
conhecimento. "Quero aprender para mim, não para os clientes",
afirmou.
Para a profissional do sexo, a intenção é aprender
várias expressões para que a conversa possa fluir melhor. Ela e outras
prostitutas contam que os clientes são curiosos e exigem atenção. "Eles
perguntam tanta coisa", contou Agatha.
Extrovertida, Laura do Espírito Santo conta que tem
uma filha que estuda em Portugal; está fazendo doutorado. Perguntada se foi
difícil se tornar uma prostituta, ela não hesita: "No princípio, eu me
senti constrangida. Mas depois que solta a franga, é difícil pegar [a
franga]", disse aos risos. Sobre a rotina de programas, repetida há anos,
diz que o importante é não ter o nome sujo, não abusar do álcool e não usar
drogas. Para ela, o que faz é um trabalho como qualquer outro. "Eu entro
no hotel de cabeça erguida e saio de cabeça de erguida", disse.
Ainda há vagas
De acordo com a Associação das Prostitutas de Minas
Gerais (Aprosmig), 800 garotas e garotos de programa trabalham no Centro de
Belo Horizonte, principalmente em hotéis da Rua Guaicurus.
O projeto é apoiado pelo dono de um shopping
popular na reguião, que empresta as salas. A ideia do curso surgiu para elevar
a autoestima das garotas de programas e melhorar o contato delas com os
estrangeiros.
Após uma entrevista em que dirigentes comentaram
sobre o projeto, apareceram muitos professores voluntários. Atualmente, são 12,
segundo a associação. As alunas não pagam nada.
0 Comentários:
Postar um comentário
Deixe seu comentário!
Assinar Postar comentários [Atom]
<< Página inicial